17 de dez. de 2012

O Hobbit: uma jornada inesperada


Onze anos.

                Onze anos de espera desde o primeiro boato, ainda em 2001, sobre Peter Jackson ter adquirido os direitos de filmagem do Hobbit. À época, os fãs ficaram em polvorosa, impulsionados pelo então lançamento da trilogia do Senhor dos Anéis. E agora, onze anos depois, entende-se porque tivemos que esperar tanto: era, simplesmente, o tempo certo da espera – para criar uma nova geração de fãs e, ainda, alimentar e amadurecer a antiga leva de sedentos pela Terra Média, além de, claro, hoje podermos contar com certas tecnologias que à época ainda não existiam – mas eram sabidas. Foi inquietante esperar, mas valeu a pena.

                Em “O Hobbit: uma jornada inesperada” (redundante dizer que esperamos onze anos, então, não é tão inesperada assim?), toda a estrutura do herói tá ali, e não vai decepcionar nenhum fã do gênero: temos o herói-wannabe, interpretado por Richard Armitage (Thorin Escudo de Carvalho) que é o rei sob a montanha, só que não é nem rei nem tem montanha (ei. Psiu! Vai reinar lá em casa!). Outro herói-wannabe é o próprio Bilbo Baggins (Martin Freeman), que não quer a missão de ser um ladrão, mas que acaba aceitando pelo espírito da aventura, adormecido em suas entranhas. O alívio cômico fica por conta da dupla Fili e Kili que, meodeos, alivia muito mais que os momentos de tensão! Aliás, os anões são esteticamente perfeitos para todos os gostos: tem os clássicos velhos-barbudos, os com cara de viking, o ruivo, o meio bobo e o trio de belos Kili-Fili-Thorin. <3 o:p="o:p">

O momento chave é quando Gandalf (o mestre) dá a missão e, após a dúvida, Bilbo aceita o desafio, literalmente assinando o contrato. Este é o primeiro momento em que o fã se arrepia. Aliás, é aí que começa as lembranças: as primeiras cenas são do Senhor dos Anéis, do tempo em que Bilbo está escrevendo o diário e Frodo ainda não fez sua jornada. Ver o Condado com “May it be” tocando de fundo fez com que eu me sentisse novamente com dezessete anos e sentisse os olhos se encherem d’água.

Logo no começo do filme Gandalf fala a Bilbo: “Requer muita coragem matar alguém, porém, requer ainda mais coragem deixar alguém viver”. Você sabe exatamente quando Bilbo perceberá isso – e quando ocorre, o expectador vibra. Pontos extras para a maquiagem de Gollum, que “ficou mais jovem”, como deveria, e, no entanto, conserva a mistura exata de doçura e perversidade: a dualidade que o acompanharia por toda a vida.

Sabemos que a jornada começa com a cantoria dos anões, Far Over the Misty Mountains Cold”. A primeira vez é arrepiante e o expectador sabe o que está por vir. Desde então, toda vez que um obstáculo é superado, entra a música tema, gerando um sentimento de conquista mesmo para nós, que não estamos atravessando a Terra Média.

A adaptação cinematográfica é boa, cortando os momentos desnecessários, por vezes trocando-os por piadas (em vez de Gandalf acordar Bilbo no dia seguinte para lembra-lo da viagem, optou-se por Gandalf apostar com os anões que o hobbit toparia a empreitada). Dá pra ver exatamente onde e quando Guillermo del Toro (seulindo!) dá pitaco, especialmente no quesito plástico e na sombriedade das criaturas (a ver o Rei Orc, que parece primo distante da criatura curiosa do Labirinto do Fauno).

Nota-se, também, que apesar de se chamar “O Hobbit”, o filme não se limita a apenas este livro. Há menções claras a Contos Inacabados e o Silmarillion, o que permite o fã se sentir mais lembrado, já que na trilogia anterior houve reclamações, a ver a adaptação de Radagast, O Castanho, que tinha um quê de Tom Bombadil e que podia facilmente ser interpretado por Helena Bonhan Carter, já que ela curte tanto uma esquisitice. Há também diversas menções à cultura nerd de todos os gêneros: o cão de Azog é claramente inspirado em Fulchur, d’A história sem fim; o orc que luta com Bilbo quando cai e só ouvimos sua respiração, tal como Darth Vader; a comitiva correndo pelas montanhas e quase caindo, como a clássica cena dos Goonies. Isso, meus caros, é associação por imagem e ajuda a vender. #ficaadica

Mais uma vez a fotografia e a coloração fazem um espetáculo à parte. Ponto extra para as tomadas de cena de Rivendell, as do Senhor das Águias sobrevoando as montanhas e a batalha dos Deuses Gigantes. Há, porém, cenas confusas, como a da escapada da comitiva do Reino dos Orcs, propositalmente feita para gerar uma boa cena de vídeo-game ou para aproveitar melhor a tecnologia 3D do filme.

Esta primeira etapa de “O Hobbit” é, no fim das contas, o surgimento e a redenção de dois heróis que não o querem ser. Thorin Escudo de Carvalho (que sua barba jamais caia!) está assustado, porém, não confessa, pois, afinal, todos confiam nele. Cego em reconquistar sua montanha, depara-se com um fantasma de outras batalhas: Azog, o Orc Albino. Ele parte, então, numa missão suicida pra cima do oponente e é extremamente importante que o expectador perceba que neste exato momento, quando Thorin se mostra mais anão do que rei, quando é puro sentimento (de ódio), é exatamente quando ele perde seu escudo de carvalho (que cai em câmera lenta). Lágrimas correm.

O filme é, naturalmente, recheado de clichês, com Gandalf fazendo entradas triunfais o tempo todo e Thorin sempre enquadrado de baixo pra cima, fazendo cara de mau. Apesar disso (aliás, quem não curte um clichê?), nada supera a cena exatamente igual de Bilbo/Frodo colocando O Anel, com este voando para cima e se encaixando perfeitamente em seu dedo. É o vínculo oficial com o Senhor dos Anéis, se até então o expectador não tiver atentado para as sombras se mexendo na escuridão, para a iminente traição de Saruman e a forma disforme de Sauron. Este é o momento em que tudo se encaixa.

Em “Uma jornada inesperada”, a redenção principal está em Bilbo Baggins. Pronto para abandonar a empreitada, ele diz que sente muita falta de sua toca e que os anões não se sentem assim porque não têm casa. Sentimos a mágoa rachando a comitiva. A seguir Bilbo se separa, encontra o Anel, etc e entendemos que a promessa que Gandalf fez a ele lááá no Condado, se cumpre: ele já não é mais o mesmo. Nunca mais o será.

É por isso que se até agora o expectador segurou as lágrimas, então chegou a hora de libertá-las. Bilbo reaparece e diz a Thorin: “Eu sei que você não confia em mim. Sei que nunca confiou. Nem eu mesmo confiaria em mim. E eu sinto falta da minha casa, de ter os meus pés aquecidos perto da lareira e do pão fresco à tarde. Mas é por causa disso que voltei. Porque vocês não têm uma casa. E eu quero ajuda-los a ter uma”. É aí que conhecemos nosso herói (ladrão) de verdade e vemos que no final das contas o que nos motiva a todos, sejam homens, anões ou hobbits, é o amor por aquilo que acreditamos. E isso nos basta.

Reencontrar os atores e a Terra Média onze anos depois foi como voltar para casa. Você se sente em família, tal como Bilbo se sentiu ao fazer parte da comitiva. 

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